31.7.09

Um filósofo contra o monopólio da verdade


O filósofo argentino Dario Sztajnszrajber, professor do Seminário Rabínico de Buenos Aires, é o organizador do recém-lançado livro Posjudaismo 2 ( http://www.prometeolibros.com/), edição de uma série de encontros em que pensadores (inclusive o brasileiro Bernardo Sorj) analisam a realidade do judaísmo em seu país, expondo dilemas que não necessariamente levam a respostas imediatas.

O pós-judaísmo, diz Darío, é também um convite ao debate, às indagações: o que nos dizem os Dez Mandamentos aqui e agora, na Argentina (e no mundo) do século XXI? – é uma dessas indagações. Quem tem o poder de dizer quem é judeu? -- é outra. Subjacentes às perguntas estão o respeito à diversidade e a oposição à exclusividade do saber que certos grupos judaicos clamam ter.

Ainda que o livro não trate especialmente de antissemitismo, enviei ao filósofo uma pergunta sobre o assunto, em razão da manifestação violenta (com alguns feridos) contra o ato público da comunidade judaica e da Embaixada de Israel em homenagem às vítimas do atentado da AMIA (Associação Mutual Israelita Argentina), em Buenos Aires, que completou 15 anos em julho. Dario não pensa que o antissemitismo seja atualmente um risco maior na Argentina, pois a sociedade está atenta. O que existe lá, diz, são grupos minúsculos mas estridentes, de postura discriminatória, que transferem à comunidade judaica sua oposição à política do governo israelense e tendem a reiterar a eterna “incorreção” dos judeus.

Ademais, acrescenta, a atenção da mídia alenta a tendência a exigir dos judeus uma conduta exemplar. “Creio que o maior antissemitismo está colocado nessa exigência. A Israel se exige o que não se exige a nenhum outro país”.

Ma, afinal, em que lado do espectro ideológico estão esses grupos? (na manifestação violenta de julho, a maioria dos manifestantes parecia ser do Quebracho, grupo de programa bastante confuso mas idenficado com de extrema-esquerda por um tipo de discurso genérico anti-EUA, anti-Israel, pró-Chavez).

Diz Darío:

“A confusão ideológica, acredito, mostra a crise tanto do discurso das esquerdas como dos discursos das instituições judaicas centrais. A esquerda tornou-se uma denominação esvaziada de ideologia, pois alberga posturas que vão desde o fascismo até o trotsquismo, ou desde a defesa das minorias até o apoio a regimes teocráticos. A isso se soma a crise da prática política dos movimentos de esquerda, que não conseguiram ressignificar-se para que as lutas humanistas e contra as desigualdades tenham novas formas de chegar às pessoas.

Hoje, ser de esquerda deveria consistir numa luta militante contra todo tipo de discriminação, qualquer que seja o país. O grande setor excluído atualmente são os grandes movimentos de ilegais, cuja situação em qualquer sociedade emerge de um mundo socialmente injusto (...)

Mas a resposta das instituições judaicas centrais frente a isso é colocar toda a esquerda sob o mesmo teto e acusar “a” esquerda de ser judeofóbica. Acho que não é um erro, mas uma política, pois há muitas posições no interior da comunidade que legitimam um modelo excludente. O que deve ficar claro é que não há uma ideologia judaica única, monopólica, verdadeira, sobre nenhum tema!”