16.5.09

Israel e a Santa Sé

A idéia de que a recente visita do Papa Bento XVI a Israel comprovaria a superação das divergências entre o Estado judeu e o Vaticano não resiste às análises menos apressadas. A visita foi altamente midiática, com centenas de oportunidades de fotos, que correram o mundo, mas há dúvidas quando se trata dos reais ganhos para Israel. Vou citar aqui alguns argumentos do cientista político Mitchel Bard, diretor da Jewish Virtual Library e conhecido por suas posições conservadoras (seu livro Mitos e Fatos – a verdade sobre o conflito árabe-israelense foi traduzido para o português pela Editora Sefer).

A Igreja católica, lembra Bard, tem uma relação pouco confortável com o sionismo desde que Theodor Herzl procurou o apoio do Papa Pio X para uma pátria judaica e ouviu do pontífice que os católicos não podiam reconhecer o povo judeu, já que os judeus nunca tinham reconhecido Jesus. “Se vocês forem para a Palestina, e se o povo judeu se estabelecer lá, nossas igrejas e nossos sacerdotes estarão a postos para batizar vocês todos” (o diálogo está no livro de Uri Bialar, Cross on the Star of David, Indiana University Press, 2005).

O Vaticano votou a favor da partilha da Palestina na histórica Assembléia-Geral da ONU em 1947, mas só em 1993 reconheceu o Estado de Israel. Desde então, o diálogo vem melhorando e o Papa João Paulo II visitou o país em 2000. Mas a série de equívocos da visita de Bento XVI demonstra que “as feridas do passado estão longe de ter cicatrizado”, segundo Bard. Os principais equívocos por ele apontados são:
O Papa, alemão, afirmou que se tornou membro da Juventude Hitlerista contra a sua vontade; logo no início da viagem, porém, um porta-voz do Vaticano desmentira tal pertencimento, só para ter que voltar atrás, mais tarde, ao ser informado de que o fato era de domínio público e tinha sido confirmado na autobiografia de Bento XVI.
O rabino Israel Meir Lau, presidente do Yad Vashem, mostrou-se descontente com o fato de o Papa, em discurso durante visita à instituição, não ter mencionado alemães nem nazistas como responsáveis pelo Holocausto. O Pontífice falou genericamente em milhões de vítimas inocentes, num discurso convencional, mas não especificou os judeus nem teve qualquer palavra de simpatia em relação à sua tragédia singular.
O Vaticano continua a limitar o acesso aos arquivos que podem esclarecer o papel de Pio XII (Papa de 1939 a 1958) na Segunda Guerra. Em 2008, Bento XVI anunciou sua intenção de beatificar Pio XII; e em janeiro de 2009 anunciou a suspensão da excomunhão do bispo Richard Williamson, que nega o Holocausto.
O Papa fez seus discursos “politicos” apenas nas areas palestinas. Em Belém, lamentou as perdas palestinas em Gaza e, embora exortando os jovens locais a rechaçarem o terrorismo, não mencionou o Hamas. Também condenou o muro construído por Israel, ensejando que Mahmoud Abbas aproveitasse a ocasião para chamá-lo de “muro do apartheid”. Ponto palestino na guerra de propaganda!

“A decisão do Papa de ir a Israel em peregrinação foi bem recebida e mostrou a distância que o Vaticano percorreu desde a visita de Herzl a Roma. Mas as ações e omissões durante a viagem indicaram que ainda há uma distância a percorrer antes que Israel tenha da Santa Sé o respeito que merece”, conclui Bard.