28.4.10

Leitura cabalística judaica de Clarice

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"A Escuta do Silencio e a Palavra Revelada - uma leitura cabalística judaica da obra de Clarice Lispector", monografia de Aida Lerner, nos foi enviada pela autora. Aida Lerner é professora de língua e literatura portuguesa e brasileira, radicada em Israel, e discorre sobre aspectos como a impossibilidade existencial de escapar, como teria tentado fazer Clarice, de sua condiçao judaica, inclusive pelo casamento.

Aida fala da viva chama divina, "nitzot elokit", de Clarice, e analisa alguns trechos da obra clariciana como diretamente ligados ao judaísmo, aos mistérios em torno do nome de D'us e à ética judaica. A exemplo da frase (em A Descoberta do Mundo) "A missao não é leve: cada homem é responsável pelo mundo inteiro", que se relaciona à máxima judaica "quem salva uma pessoa salva o mundo".

Embora a crítica brasileira tenha se surpreendido com algumas das recentes "revelações" do biógrafo norte-americano de Clarice, Benjamin Moser, entre elas a de que o nome da escritora era Chaia (nome hebraico comum, também grafado Haia), este era um fato conhecido - pois, queridos leitores não judeus, o judeu que aparece no registro civil como Zé ou Rosa pode ter, em hebraico, nomes como Yosef ou Rivkah. Diz Aida:
"A partir do seu nome hebraico (Chaia, que significa vida, ou, mudando-se os pontos, se refere ao corpo, em linguagem cabalistica, e no linguajar comum tem o sentido de animal ou fera), de sua vida e do seu texto, onde a exaustao enfatiza a força do seu inconsciente e da identidade que lhe é proibida ou desconhecida, atrevo-me a crer que o mistério se origina em sua dramática condição judaica jamais explicitada".
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23.4.10

Janusz Korczak, um legado para a humanidade



A Câmara Municipal de Niterói manterá de 26 de abril a 21 de maio a mostra Janusz Korczak - Um Legado para a Humanidade, realizada pelo Museu Judaico pela primeira vez em 2005 e que já foi levada a várias cidades brasileiras.

A história de Korczak pode ser lida de muitas formas. O pediatra e educador agiu de acordo com uma ética e uma coerência que foram muito além das belas palavras a favor da infância. De família judia burguesa assimilada, envolveu-se  completamente num projeto pedagógico humanista, replicado até hoje, entre as crianças mais necessitadas do gueto de Varsóvia; dizia que todas as crianças deviam ser acolhidas e ouvidas, mesmo as "más", as mais rejeitadas pela sociedade. Durante a Segunda Guerra, recusou diversas ofertas de exílio, optando por ficar até o fim com os meninos e meninas de seu orfanato, seguindo com eles para o campo de Treblinka, e a morte, em 1942.

21.4.10

O DOUTOR AFONSO, de Henrique Veltman

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O jornalista e escritor Henrique Veltman lança no próximo dia 4 de maio (na ASA) o livro "Do Beco da Mãe a Santa Teresa", um texto ágil e bem-humorado que nos remete ao cotidiano das famílias judaicas que viviam na Zona Norte e na Praça XI do Rio nos anos 1940. Notícias da Segunda Guerra, agitação política e excitação infantil pelo lançamento da Coca-Cola e do Eskibom fazem parte do cardápio.

Abaixo, uma das crônicas do livro.

O consultório do Dr. Afonso ficava num sobrado da rua General Caldwell. A sala de espera era imensa e duas escarradeiras estavam estrategicamente colocadas nas laterais. Duas obras de arte...
O piso da sala era de blocos de vidro, o que permitia a todos, inclusive ao médico, observar o que se passava lá embaixo, na farmácia. Que era do Dr. Afonso, claro.

Ele era, provavelmente, o médico mais badalado da Praça Onze. Até onde a minha memória alcança, lá pelos anos 1940, todos os meninos e meninas judeus da região passaram pelo seu consultório. Ele tinha um concorrente, sim. O Dr. Mafra, ali do lado da Igreja Matriz de Santana, com consultório nos fundos de sua farmácia.

É importante registrar que a garotada da época, primeira geração nascida no Novo Mundo, era geralmente franzina. Havia casos de raquitismo, bronquites crônicas, asma, gripes e resfriados constantes.

Por isso mesmo, um dia, Dr. Afonso recomendou a minha mãe de forma clara e incisiva: “Esses meninos (meu irmão e eu) precisam tomar banho de mar”. Naqueles tempos, as praias gozavam de muita fama no quesito saúde. Proclamavam-se as virtudes do iodo; aliado ao sol e outras condições naturais, proporcionaria a cura dos males de origem reumática e óssea.

Nessa altura, e creio que até recentemente, especulava-se muito sobre o iodo. O iodo era a panacéia universal, uma espécie de antidepressivo dos dias de hoje.

Assim, Dona Rachel não teve outra saída senão nos levar à praia – praia do Caju, conhecida na rua judaica como extremamente saudável. Os banhistas, inclusive, saíam do mar com grossas placas escuras nas pernas e nos braços. Segundo se dizia, eram as disputadas placas de iodo, absolutamente necessárias à saúde de todos!

Levamos muito tempo até descobrir que as placas eram apenas manchas do óleo despejado no mar pelos navios e pelo estaleiro do Caju... A decepção de minha mãe foi imensa. Acho que foi aí que ela desistiu das praias para sempre.

Mas foi no Caju que a criançada aprendeu a nadar. Bons tempos.

15.4.10

E se?

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Sergio Langer, cartunista e artista gráfico argentino, filho e neto de sobreviventes do Holocausto, fala de forma irônica (e autobiográfica) das marcas da tragédia. Abaixo, uma das dez páginas da história em quadrinhos La Vida Es Bella [ http://www.blogger.com/www.sergiolanger.com tem a HQ completa e mais material do autor]. É a memória se manifestando sem reverência, e com um humor que, conforme Langer, produz mais reflexão do que os rituais compulsórios e as frases de efeito repetidas ad nauseam.

8.4.10

Alerta na Hungria: extrema-direita antissemita ganha votos

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Pela primeira vez desde a ascensão do nazismo, um grupo abertamente antissemita ganhou ontem número expressivo de votos nas eleições húngaras. O resultado preocupa a Europa: o partido de extrema-direita Jobbik ficou com 16,71% dos votos, entrando pela primeira vez no Parlamento já como a terceira força política do país, logo atrás dos socialistas, há oito anos no poder.

O líder do Jobbik, Gabor Vona, prometeu devolver aos húngaros seu “orgulho nacional e identidade”. O partido cresceu junto com o desemprego, a recessão econômica e as denúncias de corrupção governamental. Por ora, a coalizão de centro-direita Fidesz, que assegurou 206 dos 386 assentos no Parlamento, nega que pretenda integrar o partido a uma coalizão governamental, por considerá-lo uma “ameaça à democracia”.

Os judeus não estão sozinhos como alvo do Jobbik, que anuncia sua disposição de resolver por "meios pacíficos" o “problema dos Roma”, como são chamados os 500 mil ciganos do país, acusados pela extrema-direita de desestabilizar o tecido social.




O Jobbik -- sigla para Movimento por uma Hungria Melhor -- fundou em 2007 a Guarda Magiar, milícia paramilitar depois colocada fora da lei (mas que ainda marcha pelas ruas), cujos adeptos fazem lembrar os grupos que atuavam antes da Segunda Guerra. Vona prometeu usar seu uniforme da Guarda quando tomar posse no Parlamento.

A retórica deles é violenta e delirante. Nas últimas semanas, um boletim publicado por um importante sindicato de policiais aliado do partido informou que “devido à nossa atual situação, o antissemitismo é não só nosso direito, mas é um dever de todos os húngaros que amam sua pátria, e devemos estar preparados para uma batalha armada contra os judeus”. Outro artigo no mesmo boletim defendeu a transferência do “nosso governo sionista” para Tel Aviv, afirmando que em caso de uma guerra civil entre húngaros e ciganos (!!), os "judeus ricos" se aproveitariam para tomar conta do país rapidamente.

Ou seja, não há como negar que o antissemitismo saiu do nicho fechado e vem num crescendo. Quando o economista Gyorgy Suranyi, judeu e ex-presidente do Banco Central, foi apontado como possível  primeiro-ministro, o rosto dele apareceu em charges na mídia tradicional dentro de uma estrela de Davi amarela, reminiscência da usada durante o nazismo. Recentemente, grafites com dizeres contra os judeus apareceram em vários pontos da capital, um memorial do Holocausto foi vandalizado em Zalaegerszeg e neo-nazistas fizeram manifestação na cidade de  Tiszaeszlár, onde um libelo de sangue levou a pogroms em 1882-83.

Numa pesquisa da Anti-Defamation League há um ano, 67% dos entrevistados húngaros concordaram com a afirmação de que “os judeus têm poder demais no mundo dos negócios” e 40% disseram acreditar que “os judeus são mais leais a Israel que à Hungria”.

Uma das candidatas mais conhecidas da extrema-direta, Krisztina Morvai, reagiu a críticas dizendo: “Eu ficaria muito satisfeita se os judeus húngaros, que se dizem tão orgulhosos, voltassem a brincar com aqueles seus rabinhos circuncidados em vez de ficarem me atacando”. E uma revista publicou uma charge de um bispo segurando uma menorá com os dizeres “É isso que você quer?”

Mídia judaica italiana

[Notícia enviada por Norma Schipper]

Um jornal judaico italiano mensal está fazendo sucesso de público e crítica: é o "Pagine Ebraiche" (Páginas Judaicas), dirigido pelo jornalista Guido Vitale para a UCEI, União das Comunidades Judaicas Italianas. O grupo também tem uma newsletter diária e uma revista juvenil, "HaTikwa".

O projeto do jornal é alcançar a comunidade maior, mostrando a face cosmopolita e ampla do judaísmo na atualidade. "Pagine Ebraiche" (www.paginebraiche.it) traz ensaios, reportagens, entrevistas, editoriais, e seu primeiro número trouxe um artigo inédito de Primo Levi sobre o papel da imagem na elaboração das memórias.

A Itália, 62 milhões de habitantes, tem cerca de 30 mil judeus. Segundo Vitale, a cultura judaica interessa muito ao público italiano em geral, tanto que o jornal está nas bancas desde outubro, com uma tiragem de 30 mil exemplares.  A percepção que a sociedade italiana tem da minoria judaica é considerada um ponto vital e estratégico para o futuro do judaísmo no país. Foram necessários meses de conversa para que as diferentes comunidades judaicas chegassem a um acordo em torno de uma publicação nacional.

Dos 30 mil exemplares, 12 mil vão para famílias judias. Há também distribuição para líderes de opinião e políticos, e o restante se divide entre assinaturas e venda avulsa em bancas para um público amplo.

Pais gays querem novos direitos em Israel


A filha de Doron Gidony e Doron Mamet nasceu nos EUA graças a uma "barriga de aluguel"

Um casal homossexual de Tel Aviv pediu à Suprema Corte o direito de ter um bebê através de "barriga de aluguel" em Israel, opção hoje só possível para casais heterossexuais. Ativistas dos movimentos gays no país conseguiram expressivas vitórias legais nos últimos anos, inclusive em relação a heranças e pensões, e atualmente muitos homens israelenses criam seus próprios filhos biológicos com um companheiro, que aparece como segundo pai legal da criança.

A ida aos EUA em busca de mães para gerar filhos é dispendiosa: o casal gasta cerca de 150 mil dólares. Agora, Doron Mamet, cuja filha Tália tem dois anos, abriu uma empresa chamada Tammuz, que barateia os custos usando esperma doado em Israel para fertilizar mulheres norte-americanas, cujos óvulos são então implantados em indianas para que levem a gravidez até o fim.

Há quem faça objeções a tal périplo, e não só por causa dos custos, mas por razões emocionais, patrióticas e médicas (os serviços de saúde de Israel estão entre os melhores do mundo).

E o judaísmo dos bebês assim nascidos? As opiniões variam: alguns rabinos dizem que a doadora do óvulo e a barriga de aluguel devem ser judias para que a criança também o seja.

[ Mais em www.forward.com.] Para quem não conhece, The Forward é um nome lendário e respeitado no jornalismo judaico dos EUA, tendo sido lançado como jornal diário em idish em 1897.

Torás em campos: verdadeiras ou falsas?

Sobreviventes de Buchenwald, campo na Alemanha liberado pelo Terceiro Exército norte-americano há 65 anos, em 11 de abril de 1945.

Um grupo chamado American Gathering of Jewish Holocaust Survivors and their Descendants [União Americana de Judeus Sobreviventes e Descendentes do Holocausto] está solicitando às autoridades do Estado de Maryland a investigação da venda de rolos da Torá pela fundação Save A Torah Inc, do rabino Menachem Youlus.

A fundação (que, como entidade filantrópica, é isenta de impostos) compra na Europa e restaura Torás alegadamente escritas antes da Segunda Guerra. As histórias de Youlus, porém, são difíceis de comprovar. Por exemplo, o rabino teria encontrado recentemente muitos dos rolos ainda enterrados no solo de antigos campos de concentração, como Buchenwald, o que a maioria dos especialistas afirma ser impossível.

O grupo que o acusa – e que representa 80 mil sobreviventes e descendentes – informa que a Save A Torah pode ter obtido financiamentos com base em argumentos no mínimo fantasiosos e, no limite, inteiramente falsos.