30.9.10

Nuremberg procura donos judeus de 10 mil livros roubados

A Biblioteca Pública de Nuremberg, Alemanha, publicou na Internet uma lista com os antigos donos judeus de cerca de 10 mil livros e documentos roubados pelos nazistas. O objetivo da lista é que eles ou seus herdeiros possam reclamá-los. Entre maio e julho de 1933, milhares de livros foram retirados de bibliotecas privadas e públicas e queimados em mais de 20 cidades alemãs, tendo os roubos prosseguido por toda a Europa até 1945.
 
Os que não foram queimados em 1933 foram armazenados. A queima foi orquestrada pelo ministro da Propaganda, Joseph Goebbels. No caso dos livros roubados em Nuremberg e arredores, o encarregado dessa destruição foi o responsável máximo do órgão de propaganda nazista "Der Stürmer", Julius Streicher.

16.9.10



A França lançou semana passada selo celebrando o 150o. aniversário da Aliança Israelita Universal, que levou educação laica a gerações de judeus de todo o mundo árabe. A Aliança, que ainda fuciona, alcançava de capitais como Bagdá e Teerã a pequenas aldeias do Marrocos.

Assim é se lhe parece....(olha o photoshop!)


À primeira vista, a foto, publicada em 14 de setembro pelo jornal egípcio Al Ahram até parece oficial (a legenda em árabe diz: "O Egito guiado pelo presidente Mubarak acolhe uma nova rodada de negociações diretas entre palestinos e israelenses").  Ao lado de Mubarak, estão Barack Obama, o Primeiro-Ministro israelense Netanyahu, o rei Abadallah II da Jordânia e o palestino Mahmoud Abbas.  Mas vejam a foto sem retoques,  da AP, com Mubarak atrás. Blogueiros do mundo árabe, indignados, estão denunciando.

13.9.10

Liberdade para tocar o shofar

Norma Schipper nos envia esse vídeo, “a mais bela mensagem de Ano Novo que recebi até agora”, diz, e acrescenta:

O vídeo mostra aqueles que chegaram a passar até seis meses nas cadeias do Mandato Britânico da Palestina por tocarem o shofar no Kotel Hamaaravi (Muro Ocidental ou Muro das Lamentações), liberado somente em 1967, na Guerra dos Seis Dias. Os ingleses proibiam os judeus de rezar no Kotel e ali tocar o shofar no Ano Novo para "não ofender os muçulmanos". Entre 1948 e 1967, quando a Jordânia dominou Jerusalém Oriental, os judeus foram proibidos até de entrar na Cidade Velha de Jerusalém. Com a derrota árabe em 1967, finalmente os judeus puderam voltar a rezar e tocar o shofar no Kotel.

Peregrinação judaica


Aproximadamente 30.000 peregrinos – todos homens, a maior parte ultraortodoxos ou hassídicos— se  reuniram em Uman, Ucrânia, neste Rosh Hashaná, o Ano Novo judaico, junto ao túmulo do rabino Nahman de Breslev, que morreu há dois séculos. O rabino foi um dos maiores pensadores do hassidismo, movimento religioso que surgiu no século XVIII, e é venerado como um tsadik (santo).

A peregrinação atrai cada vez mais judeus do mundo inteiro, inclusive muitos brasileiros. Ela ocorre num dos locais onde a história do judaísmo europeu oriental foi mais trágica: em 1728, um pogrom exterminou mais de 20 mil judeus, e durante a Segunda Guerra dezenas de milhares foram mortos pelos nazistas. Mas quem viaja a Uman, agora, não está em busca de explicações históricas ou recordações negativas; em clima de extremo júbilo e confraternização, o que se vê é gente cantando e dançando nas ruas.  

Abaixo, artigo de Henrique Veltman sobre o documentário, Yippee, que o diretor norte-americano Paul Mazursky rodou em Uman. 

Após uma visita ao oculista, Paul Mazurski, aclamado diretor do cinema americano, resolve acompanhá-lo numa peregrinação à pequena cidade ucraniana de Uman, em busca do que 20 mil judeus oriundos de todo mundo descrevem como “o mais completo sentimento de felicidade que encontram a cada passagem do Rosh Hashaná”.

Para o oculista, a peregrinação é uma celebração à vida, em que espiritualidade e festa se misturam. “Porque, afinal, Deus é alegria”. Uman tem um significado histórico para os hassidim: foi lá que, há uns duzentos anos, milhares deles foram mortos num pogrom. Como uma homenagem àquelas vítimas, Uman foi o lugar escolhido pelo Rabino Nachman de Bratislav para ser enterrado, em 1810. Ele pregava que a iluminação independe de sangue nobre ou algo parecido. Segundo o sábio são os feitos, o próprio esforço e a escolha dos atos que levam o homem à luz. Dizia que todos os judeus poderiam alcançar a glória e a mais alta plenitude espiritual. “Muitas pessoas acreditam que as histórias são contadas para fazer as pessoas dormir. Eu conto as minhas para acordá-las", dizia o rebe.

No filme, explica-se que o rabino deixou uma mensagem, que visitassem seu túmulo no Rosh Hashaná, assim ele interviria no julgamento dos Dias Temíveis.

Yippee é Paul Mazursky, ele mesmo diante da câmara. As pessoas com quem ele conversa são elas próprias; sua viagem à Ucrânia é real; e os eventos que ele documenta estão acontecendo de verdade naquele momento. Não se trata de um documentário profissional sobre a peregrinação a Uman, nem sobre as suas (de Mazursky) raízes judaicas. O estilo amador é o grande trunfo do filme, dessa Doc comédia; ele até não se leva muito a sério, e esta, talvez, seja a maior virtude do filme.

O avô de Mazursky saiu de Kiev, na mesma Ucrânia de Uman, “para fazer a América”. Mas o neto confessa-se ateu. O efeito de comédia vem justamente desse distanciamento de Mazursky em relação aos rituais da fé religiosa. Isso o leva a ressaltar o humor das cenas de judeus dançando nas ruas. Explora o aspecto cômico das roupas, das cantorias etc. E também das condições enfrentadas por sua equipe. Mazursky saiu de Los Angeles com uma equipe mínima e 40 mil dólares do próprio bolso. Transporte, hospedagem e alimentação ficam muito próximos do que poderíamos classificar de penúria, o que oferece ótimos motivos para piadas tipicamente judaicas.


Em vários momentos do filme, Paul se apresenta aos hassidim e aos ucranianos como um cineasta muito famoso em Hollywood. O que ele realmente é, ou foi. Seja escrevendo, atuando, produzindo ou dirigindo, sua ligação com o cinema ultrapassou todas as barreiras. Foi indicado ao Oscar cinco vezes, mas também concorreu ao Globo de Ouro, à Palma de Ouro em Cannes e ao Urso de Ouro em Berlim, formando uma carreira vitoriosa que contabiliza 13 prêmios ao longo dos seus 56 anos de atuação. Entre seus principais filmes, em que escreveu, produziu e dirigiu, destacam-se "Bob e Carol & Ted e Alice" ,"Uma Mulher Descasada", "Luar sobre Parador" (estrelado pela nossa Sonia Braga), "Um Vagabundo na Alta Roda", "Moscou em Nova York", "Inimigos, Uma História de Amor", “Próxima Parada, Bairro Boêmio”.

Em tempo: Yipee é a expressão de alegria e comemoração por mais um dia de vida.

12.9.10

Fidel, judeus e antissemitismo


Em entrevista a Jeffrey Goldberg, da Atlantic Magazine, que está correndo o mundo, Fidel Castro afirmou que o modelo cubano "não funciona mais" para exportação (depois ele disse que sua frase foi irônica...). Para os judeus, ele deu mostras de grande simpatia, falando de maneira enfática contra o antissemitismo e a negação do Holocausto por Ahmadinejad. A matéria saiu hoje na Folha de São Paulo (só para assinantes,  http://www1.folha.uol.com.br/fsp/ilustrissima/il1209201005.htm ).

Abaixo, o trecho sobre antissemitismo e Ahmadinejad (by Jeffrey Goldberg, tradução Paulo Migliacci).


Fidel Castro, 84 anos, convidou a dirigente da Comunidade Judaica Cubana, Adela Dworin, a participar
da visita em que acompanhou o jornalista norte-americano Jeffrey Goldberg ao Aquário de Havana (onde
trabalha, como veterniária, Celia Guevara, filha do Che) 



















" Fidel deu início ao nosso primeiro encontro me contando que lera com atenção meu recente artigo para a "Atlantic", e que o texto confirmava que EUA e Israel se encaminham de forma acelerada e gratuita a um confronto com o Irã. A interpretação não surpreende, claro: Fidel é o avô do antiamericanismo no mundo inteiro, sempre foi um severo crítico de Israel.

Seu recado ao premiê israelense Benjamin Netanyahu era simples: Israel só terá segurança se abrir mão de seu arsenal nuclear, e as demais potências nucleares do mundo também só estarão seguras caso abram mão dessas armas. O desarmamento nuclear mundial e simultâneo é decerto uma meta nobre, mas, em curto prazo, não se pode defini-la como realista.

A mensagem de Fidel a Mahmoud Ahmadinejad, o presidente do Irã, não era tão abstrata, no entanto. Nessa primeira conversa, que durou cinco horas, Fidel retomou repetidas vezes suas críticas ao antissemitismo. Criticou Ahmadinejad por negar o Holocausto e explicou por que o governo iraniano serviria melhor à causa da paz caso reconhecesse a história "única" do antissemitismo e tentasse compreender por que os israelenses temem por sua existência.


Ele abriu essa discussão descrevendo seus primeiros contatos pessoais com o antissemitismo, quando era criança. "Lembro de quando era menino, muito tempo atrás, com cinco ou seis anos de idade, e morava no interior", disse. "Lembro da Sexta-Feira Santa. A atmosfera que uma criança respirava naquele dia era a de 'Silêncio, Deus morreu'. Deus morria todo ano, entre a quinta e o sábado da Semana Santa, e deixava todos muito impressionados. O que havia acontecido? E as pessoas respondiam que 'os judeus mataram Deus'. Atribuíam aos judeus a culpa pela morte de Deus! Percebe como era?"


Prosseguiu: "Bem, eu não sabia o que era um judeu; conhecia um pássaro que era chamado de 'judía', e para mim judeus eram aqueles pássaros. Eram aves de bico longo. Não sei por que tinham esse nome. É o que me lembro. Era esse o nível de ignorância da população inteira".


DIFAMAÇÃO Fidel afirmou que o governo iraniano deveria compreender as consequências do antissemitismo teológico. "Isso durou por talvez 2 mil anos", disse. "Não acredito que alguém tenha sido mais difamado que os judeus. Eu diria que foram muito mais difamados que os muçulmanos. Sofreram mais difamação do que os muçulmanos porque foram culpados e difamados por tudo. Ninguém culpa os muçulmanos por coisa nenhuma."


O governo iraniano deveria compreender que os judeus "foram expulsos de sua terra, perseguidos e maltratados no mundo inteiro, porque eram vistos como responsáveis pela morte de Deus. Na minha opinião, foi isso que aconteceu a eles: seleção reversa. E o que é seleção reversa? Ao longo de 2 mil anos, foram sujeitos a terríveis perseguições e 'pogroms'. Seria de presumir que desaparecessem; creio que sua cultura e religião os mantiveram unidos como nação". E prosseguiu: "Os judeus viveram uma existência muito mais difícil que a nossa. Nada se compara ao Holocausto". Pergunto se diria a Ahmadinejad o que estava me dizendo. "Estou dizendo o que digo para que você divulgue", respondeu ele.


Fidel continuou, analisando o conflito entre Israel e Irã. Disse compreender os temores iranianos de agressão pelos israelenses e americanos, e acrescentou que, em sua opinião, as sanções dos EUA e as ameaças de Israel não dissuadirão a liderança iraniana de sua busca por armas nucleares. "O problema não vai ser resolvido, porque os iranianos não vão recuar diante de ameaças externas. É essa minha opinião", disse.


Em seguida apontou que, diferentemente de Cuba, o Irã "é um país profundamente religioso", e disse que líderes religiosos são menos propensos a compromissos. Enfatizou que até mesmo a laica Cuba resistiu a variadas exigências americanas ao longo dos últimos 50 anos".

10.9.10

Livro aborda conceito de raça (por Vilma Homero*)

 
 
 
"Raça é menos um fato biológico do que um mito social e, como mito, causou severas perdas de vidas humanas e muito sofrimento em anos recentes." A declaração é de 1950, quando, no calor do pós-guerra, das lembranças recentes do Holocausto e dos ecos da política racial de Estados Unidos e África do Sul, a Unesco tentou deslanchar uma campanha mundial contra a discriminação racial. O que era para ser uma reflexão entre sociólogos, antropólogos e geneticistas do mundo inteiro transformou-se em discussões acaloradas sem que se chegasse a consenso.
 
O episódio e a análise do fato fazem parte do livro "Raça como Questão – História, Ciência e Identidades no Brasil", em que o sociólogo Marcos Chor Maio, pesquisador e professor do programa de pós-graduação em História das Ciências e da Saúde, da Casa de Oswaldo Cruz, da Fundação Oswaldo Cruz, e o antropólogo Ricardo Ventura Santos, pesquisador da Escola Nacional de Saúde Pública/Fiocruz, professor do  Museu Nacional e Cientista de Nosso Estado, da FAPERJ, reuniram uma série de artigos de vários autores para promover uma reflexão sobre um tema polêmico.
 
(O lançamento será em 15 de setembro, na Blooks Livraria (Praia de Botafogo, 316), a partir das 18h30).

A historiadora Lilia Schwarcz resume bem o espírito do livro: "Raça sempre deu muito o que falar: no exterior, mas sobretudo no Brasil, país identificado desde o século XVI com base em sua natureza exuberante, mas suas 'gentes um tanto estranhas'. Por aqui, o tema proliferou, seja em perspectivas positivas e alentadoras, seja com visões mais negativas. Se a representação onírica, próxima à máxima romântica do 'bom selvagem' revelou-se vitoriosa até o século XIX, é desde esse momento que noções mais pessimistas, ligadas às teorias científicas raciais, tenderiam as inverter os termos da equação. De jardim edênico, nos convertíamos em laboratório (degenerado) de raças. E é nesse contexto que se inicia a bela e sólida parceria entre Ricardo Ventura Santos e Marcos Chor Maio. Dando continuidade a vários trabalhos conjuntos que vêm realizando há longa data, Maio comenta: "O livro é também uma comemoração dessa parceria."

Em Raça como questão, eles traçam um apanhado desde o século XIX, analisando como o tema foi tratado em diferentes períodos, enfocando questões que durante certo tempo moldaram o pensamento dominante, como o higienismo, os estudos que se fazia sobre a mestiçagem ou os modelos da antropologia física, por exemplo. No artigo que abre o livro, "Entre a Riqueza Natural, a Pobreza Humana e os Imperativos da Civilização, Inventa-se a Investigação do Povo Brasileiro", de Jair de Souza Ramos e do próprio Maio, os autores refletem sobre os trabalhos de três autores: Nina Rodrigues, Sílvio Romero e Euclides da Cunha. "O foco de nossa reflexão é a trajetória da apropriação das teorias raciais europeias no Brasil e os desafios dos intelectuais na busca de soluções originais com vistas a fazer do Brasil um país civilizado. Nesse período, predomina um determinismo climático e racial no pensamento desses autores, que, apesar disso, por vezes apresentam argumentos socioantropológicos, questionando a base dessas teorias deterministas", segundo Ramos e Maio.

Num dos capítulos seguintes, Ricardo Ventura Santos se debruça sobre os estudos da Divisão de Antropologia do Museu Nacional, especialmente sobre o trabalho de intelectuais, como Batista de Lacerda e Roquette-Pinto, que por lá passaram entre o final do século XIX e início do XX. Surpreende, por exemplo, o pensamento do antropólogo Roquette-Pinto, que, na contramão de um pensamento reinante naqueles primórdios do século passado, afirmava: "os homens cultos do planeta mostram-se índios de pele branca, cobertos por uma crosta, mais ou menos espessa, de verniz brilhante." Para Roquete-Pinto, sob uma camada de cultura retrógrada ou avançada, encontrava-se um ser humano essencialmente igual em seu potencial, fosse ele europeu ou um índio da Serra do Norte. Ao que Santos avalia: "Se Roquette-Pinto apoia-se em modelos racializados em suas análises antropológicas, sua ênfase não está na existência de hierarquias no plano das potencialidades. Sob seu tom poético, está expressa a noção de que as diferenças residem menos na constituição racial/biológica do que em fatores ligados à cultura e à civilização, metaforicamente representados pela crosta de verniz brilhante." É nesse ponto que, segundo Santos, Roquette-Pinto se distingue das análises e perspectivas sobre indígenas reinantes à época.

Há artigos que abordam questões polêmicas. Em "Antropologia, Raça e os Dilemas das Identidades na Era da Genômica", analisa-se a recepção social dos estudos da equipe do geneticista Sérgio Pena, da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Pena e colaboradores abordaram aspectos da ancestralidade genética do minúsculo povoado de Queixadinha, no Vale do Jequitinhonha, no norte de Minas Gerais. "Retrato Molecular do Brasil" sugere que, no país, haveria baixa associação entre aparência física e ancestralidade genômica. Conforme demonstram Santos e Maio, as recepções foram bastante diversas. Enquanto para o ativista do movimento negro Athayde Motta, a pesquisa "seria um simulacro de suporte científico para... injetar sangue no moribundo mito da democracia racial, (...) cuja primordial função é a de manter o estado de desigualdades raciais no Brasil", para M.X. Rienzi, de um grupo de extrema-direita europeu, a conclusão sobre a inexistência de raças seria "uma peça ideológica travestida de ciência". O capítulo analisa como as evidências científicas são apropriadas pela sociedade, o que depende de contextos sócio-políticos particulares.

       
   
Maio e Santos também abordam a política de cotas, examinando o caso do vestibular da Universidade de Brasília (UnB). "Foi a primeira instituição universitária federal a adotar o sistema no país", diz Maio. Na prática, foi uma implementação controversa, uma vez que além da autodeclaração do candidato – e para "controlar possíveis burladores raciais"– exigiram-se fotos que seriam confirmadas por uma comissão. Como mostram os autores, "esses critérios geraram uma temporada de disputas científico-políticas, já que foram objeto de amplas controvérsias. (...) Aludiu-se aos paralelos entre o que estava acontecendo em Brasília e práticas tipológicas de identificação racial comuns no passado no âmbito da antropologia física e da medicina legal, vistas de forma crítica pelas ciências sociais contemporâneas". No último capítulo do livro, em co-autoria com Simone Monteiro, Maio analisa as políticas de ação afirmativa racializadas no domínio da saúde pública com base no processo de construção do campo da saúde da população negra, a partir dos anos 1990.

Marcos Chor Maio agora também se empenha no próximo lançamento de um outro livro: a publicação da dissertação de mestrado da cientista social e psicanalista Virginia Leone Bicudo, que estudou na Escola de Sociologia e Política de São Paulo sob a orientação do sociólogo Donald Pierson. Negra, ela foi uma das pioneiras da psicanálise no país. O livro faz parte das atividades do projeto "Encontro entre Antropologia, Sociologia e Psicologia Social na produção intelectual sobre raça e racismo no Brasil (1930-1950)", apoiado pela FAPERJ, na modalidade Auxílio à Pesquisa (APQ 1). Integrante da Sociedade Brasileira de Psicanálise de São Paulo, Virgínia estudou em Londres (1955-1960), onde fez cursos no Instituto de Psicanálise da Sociedade Britânica e se especializou em psicanálise da criança na Tavistock Clinic. Manteve estreito contato com a psicanalista Melanie Klein. Organizado por Maio, Estudo de Atitudes Raciais de Pretos e Mulatos em São Paulo será publicado pela Editora da Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo, com lançamento previsto para o dia 11 de novembro, durante o Seminário Internacional de Sociologia: 50 anos de Brasília e 40 anos do Programa de Pós-Graduação em Sociologia da UnB.

  © FAPERJ – Todas as matérias poderão ser reproduzidas, desde que citada a fonte.

 


6.9.10

A guerra bate à porta: relações entre judeus e muçulmanos em Marselha durante a Guerra do Golfo (1991)


(Por Maud S. Mandel)
No dia 2 de agosto de 1990, o Iraque invadiu o Kuait, desencadeando a primeira crise no Golfo Pérsico. No mês de janeiro de 1991, diante do fracasso das sanções econômicas da ONU em forçar a retirada do Iraque, os Estados Unidos e uma coalizão de trinta e quatro nações invadiram o país. Embora Israel não tenha participado, esta breve guerra – finda em 28 de fevereiro – não pôde deixar de atingir o permanente conflito árabe-israelense. Não apenas o presidente do Iraque, Saddam Hussein, decidiu jogar mísseis em Tel Aviv, dando início a uma crise secundária acerca do potencial envolvimento de Israel, como também apelos à solução da questão palestina como parte de um arranjo regional circularam amplamente. Para muçulmanos e judeus, observando de longe os acontecimentos, a Guerra do Golfo tornou-se então mais do que um conflito ligado à independência do Kuait, a direitos sobre o petróleo ou ao imperialismo ocidental. Tornou-se, em vez disso, um termômetro das relações judaico-muçulmanas ao redor do mundo. (

O parágrafo acima abre o artigo de Maud S. Mandel publicado no número 3 da revista eletrônica do NIEJ (Núcleo Interdisciplinar de Estudos Judaicos, do Instituto de Filosofia e Ciências Sociais da UFRJ). Vale a pena entrar e ler, entre outros articulistas, Marcio Seligmann-Silva analisando o filme A Fita Branca.

5.9.10

Rosh Hashaná em postais dos anos 20


Troca de culturas e idish na França (por Lilian Brower-Gomes)

Em julho desse ano, o encontro intercultural de Bréau foi excepcional, pois além das atividades regulares das oficinas de línguas, dança (coreografia e tradicional idish), música klezmer, escrita, caligrafia, os ateliers de cozinha idish e de fabricação de pão abriram um novo caminho na ligação entre natureza e cultura, entre trabalho manual e intelectual. Outra troca rica foi a da oficina de música klezmer e música d'oc [ligada à langue d’oc, ou língua d’oc, grupo de dialetos franceses falados desde a Idade Média no sul da França]. Sem misturar os estilos, a oficina concretizou o nosso sonho de trocas entre culturas. O clímax dessas trocas e do "fazer junto" foi a realização da peça de I. L. Peretz , "Uma noite no velho mercado", na praça da cidade.

Todas as oficinas - música, dança, canto, teatro, idish - contribuíram com os seus trabalhos, os participantes se vestiram a caráter, o texto foi apresentado em idish, francês, português e em langue d'oc, a prefeitura colocou seu local à disposição para que partes do texto fossem ditas a partir das suas janelas, todas as gerações participaram enquanto diferentes personagens.

Essa peça de Peretz de 1904 nunca foi integralmente montada pois pede mais de cem personagens, crianças, jovens, adultos e velhos, e um cenário e um jogo de luzes extremamente sofisticado, se seguimos as indicações do autor. Montamos uma versão curta em uma semana, com a participação de cerca de 60 pessoas (não ao mesmo tempo), entre músicos, cantores e bailarinos. A língua de base foi o francês mas muitas réplicas foram em idish, algumas em português e algumas em langue d'oc. Mas mesmo se esse ano a base foi o francês foi uma grande emoçao a presença de tantas outras línguas.

A peça durou pelo menos 1h15 minutos e deu para passar a emoção e a tensão do texto- tal como entende Batia Baum, professora e tradutora do idish para o francês. A peça não é fácil de ser compreendida, pois não há uma trama e pequenas cenas dão acesso numa esfera simbólica à complexidade das relações políticas, religiosas, sociais e pessoais em planos "intra e extra" judaicos. Peretz havia participado de um trabalho de pesquisa junto às populações judaicas na Polônia, principalmente no distrito de Tomashover. A peça é abrangente e aborda temas humanos mais gerais, dentro dos parâmetros judaicos tradicionais mas também a partir da ótica do advogado de cidade grande que ele era.

Batia Baum acha que Peretz pensou nessa peça como uma comédia musical e que os textos, escritos em forma de verso, podem ser cantados. É o que vamos tentar fazer ao longo dos cinco anos que vai durar esse projeto. Um tempo para conhecer melhor a obra de Peretz, um tempo para criar um "encontro" entre a cidade do velho mercado e a cidade de Bréau, com suas histórias, suas imagens, ssuas músicas, suas tradições, um tempo para caracterizar a época e seus movimentos culturais, políticos e religiosos dentro do mundo judaico e sua relação com o mundo em geral, um tempo para sair pelo mundo remontando a peça com quem quiser participar.

PS : Sem falar nas oficinas de "tango judio" que se improvisaram na praça a pedido dos participantes, com o Walter Sztajnberg como professor !

3.9.10

Elie Wiesel sobre moralidade: nenhum ser humano é ilegal

Ao falar ao Jerusalem Post de ontem sobre Irã, processo de paz e questões morais, o prêmio Nobel Elie Wiesel, sobrevivente dos campos de extermínio, afirmou que pela primeira vez critica publicamente um governo israelense. Ele condenou a decisão de deportar cerca de 400 filhos de trabalhadores imigrantes não judeus.

"Um pai que não pode alimentar seus filhos tem os direitos humanos tão violados quanto se fosse perseguido politicamene. E nenhum ser humano é ilegal. O ser humano pode fazer algo ilegal, mas não pode ser ilegal...", disse. "E o coração judaico, a compaixão judaica, a moralidade judaica, a consciência judaica? Fui criado numa tradição diferente. Já fui refugiado, de modo que tenho empatia com todos os refugiados".